Projeto Metageografia

Coordenação geral: Ana Fani Alessandri Carlos

 

  1. Objetivo

Pensar o mundo através da geografia exige pensar a geografia numa perspectiva crítica através da compreensão da produção do espaço. Esse é o objetivo da coleção Metageografia. Essa perspectiva crítica se apoia na hipótese segundo a qual a reprodução do espaço urbano, no mundo moderno, aprofunda a contradição entre o processo de produção social do espaço e sua apropriação privada.

O projeto editorial cujos livros serão publicados em português e inglês, tem por finalidade dar visibilidade e tornar público, o trabalho de pesquisa realizado nos 15 anos de existência do Grupo de Geografia Urbana Crítica Radical (GESP), sediado no Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo - USP - em seus diálogos com outros pesquisadores de outras disciplinas e de outros países.

 

  1. Conteúdo

As análises contidas nesta coleção se desenvolvem a partir da centralidade que a produção/reprodução do espaço urbano desempenha, hoje, na realização da sociedade capitalista. Em suas profundas metamorfoses, o espaço aponta a realização do capitalismo no plano mundial, como um momento da reprodução da sociedade, que, saída da história da industrialização, permitiu, com o desenvolvimento do mundo da mercadoria, a generalização do valor de troca, a divisão do trabalho no seio da sociedade, o desenvolvimento das comunicações, a expansão da informação, e a redefinição das relações entre os lugares de realização da vida. A extensão do capitalismo no espaço, ele próprio tornado mercadoria, faz da produção do espaço um pressuposto, condição e produto da reprodução social e, nesta direção, elemento definidor dos conteúdos da prática sócio-espacial, o que modifica as relações espaço-tempo da vida social, redefinindo contradições e produzindo novas.

 

  1. Antecedentes

O GESP reúne diversos pesquisadores em torno do objetivo de desvendar os conteúdos da urbanização hoje tendo como foco de análise os fundamentos que explicitam a desigualdade vivida concretamente no cotidiano da metrópole, tendo como perspectiva a construção de uma “geografia crítica radical”. Entende-se por “crítica radical” a disciplina capaz de revelar as contradições constitutivas do processo desigual da produção contemporânea do espaço, e que, ao potencializar o “negativo” desse processo, propõe um caminho profícuo para elucidar os conteúdos não revelados da luta pelo “direito à cidade”. A proposta do GESP envolve a produção de um conhecimento sobre a metrópole de São Paulo como ponto de partida e meio de tecer caminhos para a construção teórica de uma “geografia urbana crítica radical” em diálogo com outras disciplinas/pesquisadores. Entendida a partir do compromisso de analisar a realidade urbana em seu movimento contraditório e enfocando os conteúdos que explicitam a desigualdade vivida concretamente, essa crítica visa a construção de um projeto de “uma outra cidade”; uma outra sociedade urbana como destino do homem; trazendo como consequência a necessidade de uma reflexão que elucide nossa época, focando a análise na reprodução sócio-espacial.

 

  1. Projeto editorial

O Projeto editorial em curso apresenta-se a partir dos seguintes livros (volumes) listados abaixo, os quais cumprem uma agenda de publicação prevista até o ano de 2017, quando teremos completado o trabalho envolvido na produção de toda a coleção.

 

Volume I - Crise urbana

Coordenação: Ana Fani Alessandri Carlos

Nossa tese - fundadora de uma metageografia - é que a (re)produção do espaço, como construção social é condição imanente da produção humana ao mesmo tempo que é seu produto. Neste raciocínio, a produção do espaço seria uma das obras do processo civilizatório. Este livro pretende contribuir para o desvendamento da produção do espaço urbano e do papel da Geografia - no diálogo necessário com outras disciplinas- na compreensão do mundo moderno diante dos problemas de uma época, na qual o espaço vem assumindo um protagonismo inédito, na medida em que a reprodução da sociedade capitalista se realiza, hoje, através da produção do espaço urbano, iIuminando momentos da prática social como práxis espaço-temporal.

 

Volume II - A cidade como negócio

Coordenação: Ana Fani Alessandri Carlos, Danilo Voloschko, Isabel Pinto Alevarez

A reprodução do capital hoje se realiza através da produção do espaço, tese esta apontada por Henri Lefebvre e desenvolvida por Harvey em seu livro O novo imperialismo através de transformações nas relações entre os Estados. Nossa tese é que, no momento atual, este processo encontra na produção do espaço metropolitano sua base de realização (Carlos, 2001). Uma reprodução que se realiza enquanto condição da reprodução do capital a partir de três elementos fundamentais: 1) a realização do capital financeiro através do setor imobiliário apontando uma “nova conquista do espaço”, como momento de extensão do capitalismo, reproduzindo o espaço enquanto valor de troca supondo sua intercambialidade (e com isto, a mercantilização realizando a propriedade privada do solo urbano); 2) a produção dos espaços de lazer e destinados ao turismo aonde o espaço entra no circuito comercial, como uma mercadoria a ser vendida a partir de seus tributos particulares; e 3) o desenvolvimento do comércio da droga, isto é o narcotráfico como uma forma de realização de uma nova atividade econômica que, com a peculiaridade, de ser uma mercadoria ilegal, pressupõe estratégias diferenciadas, isto, é, para que este comércio se realize ele precisa antes dominar um espaço. Esse três setores econômicos, realizam-se, hoje, através da produção de um espaço apropriado a cada uma das novas atividades – neste sentido o espaço aparece enquanto condição de realização da reprodução ampliada do capital em sua totalidade, revelando a dimensão estratégica do espaço.

 

Volume III - Justiça espacial e o direito á cidade

Coordenação: Ana Fani Alessandri Carlos, Glória Anunciação Alves, Rafael Faleiros de Pádua

A produção do espaço aparece como possibilidade renovada de realização da reprodução: um processo que encontra seus limites gerando imensos conflitos. Esta reprodução (explosão da cidade/extensão do tecido urbano, pela generalização da urbanização) revela a generalização da segregação (reproduzindo-se enquanto tal). Isto porque, o movimento da reprodução da metrópole revela os conflitos e limites desta reprodução no espaço – revelam sua dialética –, apontando as contradições do espaço.

A privação do urbano está no fundamento das lutas pelo espaço. O que está posta na realidade urbana brasileira com as manifestações de ruas exigindo a superação do entendimento da cidade enquanto quadro físico para considerá-la em seus conteúdos mais profundos: as contradições que sustentam a reprodução do urbano hoje.

No momento atual a globalização econômica trouxe a concentração sem limites da riqueza com a privatização da riqueza gerada na sociedade. Há na contrapartida, uma crise da identidade, sua realização no plano abstrato das mercadorias, revela a vitória da abstração no mundo moderno momento em que a história cessa de fornecer os referenciais. Envolto numa nuvem de imagens, preso pelas formas, enlaçado pelo discurso e submetido pela ideologia, o homem, hoje, compreende mal as suas relações com a sociedade, e ao invés de dominar as relações é dominado por elas, manipulado pelas forças econômicas e sociais. Todavia essa submissão traz aquilo que a nega: a necessidade de emancipação do homem dessa situação, exigindo a abolição de suas condições de exploração e opressão, o que esta no fundamento dos movimentos sociais e das manifestações públicas. Estes sinalizam a consciência da extrema privação, uma leitura que não se fecha na esfera dos bens necessários a realização da vida, mas abre-se para a escala da realização dos desejos de um projeto fundado num outro humanismo que ultrapassa a esfera "do ter" e da busca desenfreada pela qualidade de vida.

 

Volume IV - Geografia: 13 palavras chaves

Coordenação: Ana Fani Alessandri Carlos, Cesar Simoni Santos, Simone Scifoni

Pensar o mundo moderno através de sua dimensão espacial dando centralidade à "produção do espaço' traz exigências teóricas que nos obriga a rever os conceitos que fundam a Geografia. Esse volume traz consigo, portanto, o propósito de revisitar os conceitos mais fundamentais e que fazem parte da história da geografia a partir de uma perspectiva crítica. Seu intuito não deve ser confundido, no entanto, com aquele de um mero exercício das capacidades de ajuizamento de um grupo de pesquisadores contemporâneos. A avaliação que se pretende fazer sobre o grande repertório conceitual da geografia está pautada num tipo de atualização crítica desses conceitos que, por isso, restaura suas pertinências para o debate acadêmico atual. Assim, as considerações que daí devem seguir não desprezam a longa tradição disciplinar que criou e trabalhou o referido repertório. Seguindo a linha dos demais volumes desta mesma coleção, o ponto de partida para esse trabalho é a orientação marxista-lefebvriana que repousa sobre a perspectiva da produção do espaço, o que deverá mobilizar essas categorias tomando em consideração os aspectos objetivos e da transformação da realidade. Dessa forma, impõe-se, aqui, um prospecto que procura ligar a história disciplinar às necessidades contemporâneas dos trabalhos de geografia.

Território, Espaço, Tempo, Paisagem, Região, Escala, Natureza, dentre outras, fazem parte das categorias e conceitos que serão observados sob esse viés e por isso não deverão permanecer como partes de um patrimônio intocado na esterilidade das vitrines de uma tradicional história do pensamento.

 

Previstos para lançamento no ano de 2017, temos ainda os volumes V, “Geografia: diálogos contemporâneos”, e VI, “As resistências na cidade como luta pelo espaço”. Com isso a coleção Metageografia se completa trazendo, sobretudo, as considerações críticas de uma perspectiva de análise consubstanciada nesses 15 anos de duração do Grupo de Geografia Urbana Crítica Radical – GESP.